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Afinal, quem é Francisca van Dunem, a mulher de quem toda a gente fala?

Foi a maior surpresa dos nomes apresentados por António Costa ao Presidente da República, e que passarão a figurar no novo Governo de Portugal.

 

[van Dunem] É um nome tradicionalmente angolano, com quatro séculos. Vem de um holandês que trabalhou para a coroa portuguesa e se estabeleceu em Angola. Relacionou-se com uma angolana com quem teve uma larga prole. Os respetivos descendentes decidiram seguir o exemplo e há imensos van Dunem

 

Francisca van Dunem, nasceu no dia 5 de novembro de 1955 em Luanda, Angola (à data colónia portuguesa), tornando-se Ministra da Justiça poucos dias depois de ter completado 60 anos. Tem um percurso e uma história de vida invulgares, que só a fizeram chegar a Portugal em 1973, já com 18 anos para tirar o curso de Direito na Universidade de Lisboa.

 

Quando se deu o 25 de abril, parou o curso, voltou para Luanda, ingressou no MPLA, fez a recruta militar, foi voluntária numa rádio de campanha e ajudou como pôde até à conclusão do processo da independência e ao ano em que regressou a Portugal.

 

Irmã de José van Dunem, alto responsável do MPLA e apoiante de Nito Alves, assassinado por forças leais ao Presidente Agostinho Neto na sequência do golpe de Estado de 27 de maio de 1977, o mesmo ano em que Francisca van Dunem decidiu voltar para Lisboa com o seu sobrinho agora órfão, que criou como se fosse seu filho, terminar o curso e aí prosseguir a sua vida profissional, ingressando no Ministério Público em 1979, onde exerceu as mais variadas funções nos últimos 30 anos.

(Imagem: Reprodução Expresso)
(Imagem: Reprodução Expresso)

A antiga representante de Portugal no Comité Europeu para os Problemas Criminais no Conselho da Europa tem uma vida dedicada a lutar contra a criminalidade. Nos anos 80 fez inclusivamente parte da Alta Autoridade Contra a Corrupção. Em 2001, depois de uma longa carreira como magistrada em Lisboa e Loures, antecedeu a Maria José Morgado e assumiu a coordenação do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, e mais tarde, em 2007, foi nomeada Procuradora-Geral-Distrital de Lisboa, tornando-se assim a principal responsável pelo maior distrito judicial do país, com jurisdição nas comarcas de Lisboa, Lisboa-Norte, Lisboa-Oeste, Açores e Madeira, chegando a vogal do Conselho Superior do Ministério Público. Foi já nestas funções que orientou e coordenou os megaprocessos contra o tráfico de armas na PSP e a corrupção na Marinha.

 

Em 2012 era tida como uma das principais candidatas a ocupar o cargo de Procuradora-Geral da República e o ano passado no concurso para o Supremo Tribunal de Justiça teve a terceira melhor classificação, o que a torna elegível para ser juíza conselheira, assim que abrirem vagas na instituição.

 

No discurso político a questão racial continua a ser tabu, manifestamente

 

O currículo invejável faria com que fosse uma natural candidata a qualquer cargo relacionado com Justiça em Portugal, sem que tal constituísse surpresa, não fosse por um pequeno grande detalhe: Francisca Van Dunem será a primeira mulher negra a ser ministra de um governo português. É o ultrapassar de mais uma barreira histórica e logo pela mão de quem no início da década de 2000 foi a representante portuguesa junto do Conselho de Administração do Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia.

 

Numa entrevista concedida ao Jornal Público em 2012, a nova Ministra da Justiça não teve problemas em abordar de forma frontal a questão racial em Portugal. Considerou que o tema em Portugal é visto como um tabu, sobretudo no discurso político e evidenciou que “essa espécie de contra preconceito”, de pensar que os problemas do racismo e da discriminação não se põem entre os portugueses, é paralisante e leva a que haja pouco ou quase nenhum progresso visível nesse campo.

 

Falta a abordagem franca da questão. Era importante encararmos isso como um problema que se calhar nem é assim tão difícil de resolver. Há uma componente educacional, mas é preciso investir nela

 

Apesar disso, a então magistrada confirmou que nunca se sentiu discriminada no seu local de trabalho, numa área que por natureza até é conservadora, disse acreditar que a Justiça portuguesa não é racista, apesar de estar segura de que há racismo em Portugal. Sabe-o mais pela experiência vivida pelos filhos, do que pela sua própria experiência, revelou em entrevista concedida ao Jornal Expresso em 2009, onde refere que apesar dos filhos terem uma diferença etária de 20 anos, não houve qualquer diferença no que sofreram na escola em Portugal. eEm 20 anos não registou qualquer evolução.

 

Nenhum facto na vida me deu a dimensão da violência da discriminação racial como o estupor com que os meus filhos, cada um a seu tempo, antes de terem completado os três anos, chegaram da escola e, entre o amargurado e o atónito, me interpelaram sobre a razão porque a diferença da sua condição racial legitimava outros a amesquinhá-los e a maltratá-los

 

Francisca van Dunem é favorável a que se adotasse em Portugal uma política de censos raciais, extensíveis a toda a população, que permitisse ter resultados que refletissem e permitissem ao Estado apurar, perceber e minimizar as dificuldades maiores de cada etnia, de forma a atenuar as diferenças em função da cor da pele, tal como acontece atualmente com as questões de género.

 

No final do seu mandato se farão as devidas avaliações sobre o mesmo, mas por agora, a escolha de António Costa para a pasta da Justiça agradou a vários setores da sociedade, pelos mais diversos motivos, mesmo aos que são tradicionalmente mais dificeis. Em entrevista ao Expresso António Ventinhas, Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, referiu que a escolha ter recaido sobre Fransisca van Dunem, mais que positivo, tinha sido um sinal muito positivo uma vez que “a Dra. Francisca Van Dunem é uma magistrada, conhece muito bem o sector e pode, de facto. ajudar a resolver os problemas, porque está no sistema há mais de 30 anos e até recentemente num cargo de gestão”.

9 Comentários

  1. 25 Novembro, 2015 às 21:44 — Responder

    Tive o privilégio de conviver, brincar e crescer com a numerosa família Van Dúnen em Luanda.
    Face ao que conheci. e ás memórias que tenho, só me resta afirmar:
    – PARABÉNS E VOTOS DE GRANDE SUCESSO.

  2. DINIZ SILVA
    26 Novembro, 2015 às 12:18 — Responder

    NÃO CONHEÇO A SENHORA MAS O CURRÍCULO FALA POR ELA. NO ENTANTO ACRESCENTO QUE QUALQUER NOME É MELHOR QUE A TRAMPA QUE TÍNHAMOS ATÉ AQUI

  3. julio
    26 Novembro, 2015 às 19:20 — Responder

    A essa nobre pessoa desejo muito sucesso. Parabéns à magistrada e à mulher.E ao Filipe que gosta de esportes, aconselho pesquisar a arte sem igual de Pelé. Não há nada que chegue perto desse enviado do alto para jogar bola.

  4. mutaro balde
    3 Dezembro, 2015 às 18:17 — Responder

    Enquanto a vida a esperança.

  5. M.G. Castro
    9 Abril, 2016 às 15:41 — Responder

    Tenho 73 anos.O meu pai e meu tio, respectivamente administrativo e vice presidente da câmara de Luanda, falavam de um sr.Van Dunen , também funcionário ds câmara, que, muitas vezes, dizia ao meu pai, acariciando a cabeça de uma criança, seu filho :
    Sr. Almeida, pode escrever:este menino ainda vai ser ministro, ou mesmo presidente de Angola!
    Julgo saber que há ou houve recentemente um ministro Van Dunen no governo angolano . Será talvez seu familiar?!
    Para não me alongar mais, desejo -lhe muitas felicidades e Saúde para poder exercer o seu trabalho. Estou muito contente de ter uma Angolana como Ministra de Portugal !!

  6. Matt Marr
    9 Maio, 2016 às 11:47 — Responder

    Faz parte da agenda de encher o barril de polvora antes de fazer explodir a caça aos negros, dissidentes etc, após declarar o regime oficialmente nazi na UE e EUA

  7. jonas savimbi
    11 Agosto, 2017 às 6:48 — Responder

    Portugal já tinha um primeiro ministro negro, agora tem uma ministra… xissa penico

  8. quatro
    8 Maio, 2018 às 19:56 — Responder

    sr. dabimbi olhe que você tambem, sr. davinbi.

  9. Isilda Salvado
    15 Abril, 2020 às 2:08 — Responder

    E a mim que chamam branquela. Não é racismo?

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