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“Aceita que dói menos”: como entender a cabeça dos americanos ao eleger Trump

Leya

 

A não ser que Baba Vanga (Famosa vidente Búlgara) esteja certa e Obama seja mesmo o último presidente dos EUA, estamos prestes a entrar na era Trump.

 

Pode parecer estranho uma candidata politicamente mais experiente e ponderada, de discurso inclusivo e aberto ao diálogo, apoiada pela esmagadora maioria da classe artística americana (e do mundo), perder a eleição para um símbolo do retrógrado machismo do século XX, com uma postura nazista perante as minorias e bélica frente ao que considera serem seus inimigos.

 

Muitos vão citar como razão a tremenda falta de carisma de Hillary Clinton, o seu lado sombrio de alianças e proximidade com os grandes tubarões de Wall Street, ou os seus emails secretos que só fizeram aumentar a desconfiança para com a sua integridade ética. Tudo perfumaria. Não foi nada disso que impediu a volta da veterana senadora para a Casa Branca.

 

Se a lógica do voto pela opção do “menos pior” (hoje em dia muito na moda) fosse o fator determinante, Trump, com seus discursos saídos de alguma série apocalíptica do Netflix, ao pregar a construção de muros na fronteira, o saqueamento descarado do petróleo alheio, ou o aquecimento global como uma invenção dos chineses, não teria chance alguma.

 

O verdadeiro motivo

Trump ganhou porque a eleição é definida por eleitores: cidadãos com prioridades que vêm antes do casamento gay, do bom relacionamento com a China ou o combate ao aquecimento global. São americanos com dificuldades de pagar as hipotecas das suas casas, ter acesso a tratamentos médicos adequados, e colocar seus filhos no mercado de trabalho. Tudo recai sobre os interesses nacionais e sobretudo pessoais de uma parcela da população pouco instruída e politicamente engajada.

 

Não que Trump seja mais apto para resolver esses problemas. Mas não é isso que está em causa. A sua oponente foi seu maior trunfo. Hilary representa a continuidade da velha política. A certeza de manutenção do modus operandi. Ex-primeira dama, senadora, indicada do presidente em exercício. Aos olhos dos americanos, “mais do mesmo”. Aí você pergunta: E isso justifica escolher uma opção ainda pior? Aí voltamos ao início do texto. Os americanos parecem ter cansado dessa forma de votar. Já não buscam o “menos pior”. Querem jogar um coquetel molotov na política e depois logo se vê o que acontece. É uma tentativa desesperada de um povo em busca de voltar a ter o seu welfare de outros tempos. O resto é secundário.

 

Trump: a pessoa errada na hora certa

Convenhamos que Trump cumpre bem esse papel. Transmite transparência (fala o que pensa por mais impopular que seja a declaração), é um símbolo americano de êxito capitalista (por mais absurdo que isso possa ser), e tem um slogan que toca no coração de uma massa gigante de pessoas descontentes. “Make America great again”.

 

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O historiador israelense Yuval Harari, autor do best seller “Sapiens” explica isso muito bem em sua obra. A evolução cognitiva do ser humano e o crescimento da socialização tornou o homem mais individualista. Infelizmente a globalização parece gerar esse paradoxo. Estamos todos conectados, e ao mesmo tempo a pensar mais no nosso umbigo. Não é o que se deseja, mas é o que acontece. O crescer dos movimentos de extrema direita no mundo assim o demonstram. É claro que devemos lutar contra essa tendência, mas isso só é possível se conscientizando do processo e principalmente evitando os erros do passado.

 

Os americanos estão cansados dos discursos politicamente corretos que na prática não se traduzem em melhorias nas suas vidas.

 

Se fossem mais atentos a indicadores e sobretudo do seu papel perante o planeta, viriam que o seu país melhorou muito nos últimos anos. Durante a gestão Obama, a produção de energias renováveis aumentou 293%, Guantánamo perdeu 63% dos seus prisioneiros, as exportações subiram mais do que as importações, foram gerados mais de 9 milhões de empregos internamente.

 

Bom para o mundo, nem tanto para o Homer Simpson. O poder de compra já não é o mesmo, a saúde está cada vez pior, a insegurança só aumenta. Cultura e visão global não é o forte do norte-americano médio, mas também não faz parte dos seus hábitos ficar de braços cruzados. Eles querem ver mudanças.

 

Não vai ter nu frontal do Mark Ruffalo

Os EUA não são só os hipsters e empreendedores de startups da Califórnia e os cosmopolitas de Wall street em Nova York. São uma classe operária gigante que ainda não percebeu que mundo agora é outro. Não adianta ir buscar petróleo na Líbia, porque o planeta agora será movido por outras fontes de energia, nem construir muros num mundo que flui por redes digitais sem fronteiras. Mas isso já é tema para um próximo artigo.

 

Deus abençoe a América

 

NOTA: Pergunto aos nossos leitores: Estão os americanos sozinhos nessa tendência? Não me parece. Vejam o crescimento de Le Penn em França, O Brexit, a estado da política no Brasil, em Angola ou em Moçambique. O povo está transportando o clima de guerra civil (em maior ou menor grau dependendo do país) das ruas para o Legislativo. Ou alguém conhece uma bomba melhor de efeito prolongado melhor que Trump?

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