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Ativistas presos em Angola: detidos escrevem carta desde a prisão

O grupo dos 15 ativistas detidos no hospital-prisão de São Paulo divulgou uma Carta Aberta aos Angolanos em que descrevem os 128 dias de detenção e expõem a sua opinião sobre o ocorrido, apontando que perdoar “é o melhor caminho”.

A carta, divulgada pelo Rede Angola, é datada de ontem e assinada por Nuno Álvaro Dala com o consenso dos outros ativistas. No texto, o grupo relata o que os presos passaram nos diferentes estabelecimentos prisionais por onde foram colocados nestes mais de quatro meses de detenção.

Ontem, também por meio de uma carta, Luaty Beirão anunciou o fim da greve de fome, que já durava 36 dias.

Leia a íntegra da carta dos ativistas detidos:

(Imagem: Reprodução Rede Angola)
(Imagem: Reprodução Rede Angola)
(Imagem: Reprodução Rede Angola)
(Imagem: Reprodução Rede Angola)

“Carta Aberta aos Angolanos

Prezados compatriotas,
São passados mais de 120 dias, isto é, quatro meses desde que, no dia 20 de Junho, fomos detidos na Vila Alice, na sala de aula no instituto Luandense de línguas e informática (ILULA).
Cumpriamos então com mais uma secção de debate no quadro do curso do activismo regido pela filosofia política consubstanciada no livro de “From dictatorship to democracy” (Da ditadura a democracia), de autoria do filósofo e activista Gene Sharp.
Desde o dia da nossa detenção até hoje as acusações transformaram-se diversas vezes (de “preparação do golpe de estado“ a “actos preparatórios de rebelião”…), o isolamento, e a incomunicabilidade, a água bruta imprópria para consumo, a comida de má qualidade, a escuridão das celas, as camas de betão, os mosquitos e outras condições desumanas provocaram-nos diversas doenças, foram e continuam a ser uma terrível prova à nossa integridade ética e à manutenção dos nossos ideais em geral, em prol de uma Angola de todos e para todos.
É um facto que alguns companheiros foram agredidos fisicamente por agentes dos serviços prisionais e outros, tão ciosos que são em cumprir com as “orientações superiores“ que há muito substituíram a constituição e a lei. Mas mantemo-nos firmes.
Ao longo dos anos desenvolvemos um pensamento político e um conjuntos de acções regidos por uma filosofia assente nos valores da dignidade humana, igualdade, justiça social, desenvolvimento, tolerância, angolanidade e reconciliação.
Nossa proposta de PROJECTO POLÍTICO FILOSÓFICO DE NAÇÃO depende, entre outras questões, que Angola deve ser construída por todos, e que a reconciliação nacional deve ser um processo de todos e para todos.
Temos sofridos tremendamente com a prisão e suas condições que provocaram diversos danos a nossa saúde: problemas de visão, infecções no sangue, infecções na pele, infecções urinárias, gastrite, hérnias, amigdalites etc. Mas não desenvolvemos qualquer ódio. Não odiamos o presidente da república nem aqueles que executaram a trauma urdida contra nós. O perdão é o melhor caminho.
Sabemos muito bem que a ética do mal que rege os agentes do regime também rege, inclusive, o juiz indicado para nos julgar em Novembro, mês em que Angola completará 40 anos de independência. Estamos cientes de que já fomos condenados publicamente pelo regime de José Eduardo dos Santos.
Ainda assim, pedimos a todos os Angolanos de bem para que PERDOEM ESTA GENTE. Os detentores do poder estão cientes de todos os males que perpetraram contra os Angolanos ao longo de 40 anos. É compreensível que vivam permanentemente aflitos e com medo de perderem tudo (inclusive as riquezas que saquearam à nação) e de serem julgados por um povo que sente na carne e no osso os efeitos de uma paz perversa que morde mais que a guerra.
Do presidente da república o último agente da opressão – todos eles precisam de PERDÃO.
Ódio e vingança não são o caminho para o futuro de Angola (uma Angola livre democrática e de bem-estar).
Em alta estima subscrevo-me
Nuno Álvaro Dala com o consenso dos 14 activistas detidos do Hospital prisão de São Paulo.
Luanda, 27 de Outubro de 2015″

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