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Erasmus na primeira pessoa

Após uma pandemia que abalou o mundo, muitos estudantes largaram Portugal para viverem o que descrevem como “uma das melhores experiências de sempre”. Apesar do período negro que o mundo atravessou, há cada vez mais portugueses e, principalmente, portuguesas a embarcar no programa de mobilidade Erasmus. Mas estudar nas universidades portuguesas ou estrangeiras tem diferenças. Descubra quais.

 

Ana Marques, 20 anos, encontra-se a fazer Erasmus, em Roma, Itália, um dos destinos mais escolhidos pelos portugueses, neste tipo de experiência. Está no segundo semestre do 2º ano da licenciatura em Relações Públicas e Comunicação Empresarial. Frequenta a La Sapienza, Universidade de Roma, instituição de ensino superior público. Na instituição de ensino italiana, as unidades curriculares ou disciplinas têm mais créditos do que em Portugal. O habitual e máximo em Portugal são seis créditos. Em Itália, o mínimo são sete: “Portanto, estou a fazer cinco cadeiras, o que equivale a quase 50 créditos, ou seja, mais 20 créditos que o normal”.

A forma estranha de “brincar com os créditos” assemelha-se, mas ao contrário, à experiência de Maria Marangas, 20 anos, que está em Mechelen, na Bélgica, também no segundo semestre do 2º ano da licenciatura, também em Relações Públicas e Comunicação Empresarial. Na Universidade privada Thomas More, algumas das unidades curriculares têm poucos créditos. “Para ter as equivalências todas certinhas, tenho de concluir 11 cadeiras”. Uma das maiores diferenças para com o ensino português e também para com os outros países é existirem disciplinas que se concluem em apenas uma semana, a meio de semestre. “E nessa semana, apenas essa cadeira é lecionada”, afirma Maria Marangas.

Também Madalena Carvalho teve uma experiência europeia, mas mais perto de Portugal, na Universitat Ramon Llull, Facultat de Comunicació i Relacions Internacionals Blanquerna, em Barcelona. A capital catalã também é um dos destinos preferidos dos portugueses para Erasmus. Nesta universidade privada, onde frequentou o 5º semestre da licenciatura em Relações Públicas e Comunicação Empresarial, as aulas foram todas lecionadas em inglês, não por sua opção, mas porque todo o ensino é em inglês, tanto para alunos internacionais como espanhóis. Mas encontrou uma dificuldade: “Por vezes, os professores começavam a falar em catalão com os alunos e a compreensão era muito mais difícil.” Os planos curriculares da Universidade Thomas More, na Bélgica, também têm o inglês como idioma, apesar de ser frequentada tanto por belgas, como por estudantes internacionais.

A experiência de Madalena Pancrácio, 21 anos, foi semelhante na Universidade Sabanci, uma instituição superior privada, em Istambul. Na instituição de ensino que frequentou, também no 5º semestre da licenciatura em Economia, “os alunos de Erasmus estão misturados com os turcos porque todos os estudantes têm aulas em inglês”.

 

Do outro lado do oceano

Catarina Barroso, 20 anos, atreveu-se a ir mais longe. Atravessou o Atlântico e rumou em direção ao Brasil. Frequenta o 4º semestre da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, que, como refere, “se assemelha à Universidade Católica de Portugal, em termos de ensino e modo de funcionamento”. Aqui, os alunos de intercâmbio estão todos em turmas de brasileiros, mas há algumas unidades em inglês. Catarina Barroso explica que “é possível ter cadeiras em inglês ou em português e que os alunos de intercâmbio que não falam português têm de frequentar cursos de português”.

Este registo é parecido com o que está em vigor na Universidade La Sapienza de Roma. Ana Marques tem aulas em italiano, assim como todos os alunos de Erasmus. “Estamos todos misturados com os alunos italianos. Apesar disto, alguns professores deixam-nos fazer os testes em inglês, espanhol ou até português, dependendo do conhecimento do professor”. Tal como na instituição brasileira de ensino privado frequentada por Catarina Barroso, esta universidade italiana oferece aulas da língua materna, durante todo o semestre, como acontece com o Instituto Politécnico de Lisboa, onde Ana Marques estuda. “É tudo misturado, entre italianos e internacionais, uma vez que as aulas são em auditórios enormes para 200 pessoas, o que faz com que os professores usem microfones, assim como os alunos nas apresentações. Ao início, é um pouco intimidante”, confessa.

Em relação às “polémicas” presenças e faltas, na universidade La Sapienza que Ana Marques frequenta, o sistema de controlo de presenças não existe. Na universidade belga onde Maria Marangas se encontra em mobilidade Erasmus “depende de cadeira para cadeira”. Na universidade catalã frequentada por Madalena Carvalho, a maioria das unidades curriculares tem sistema de controlo de faltas. Na de Catarina Barroso, existe um limite de faltas, correspondente a 75%. E, por fim, na de Madalena Pancrácio, apenas as disciplinas práticas tinham faltas.

“No Brasil, o ambiente em sala de aula é extremamente diferente”, realça Catarina Barroso. “Os alunos estão muito no telemóvel, sempre a sair e a entrar na sala, alguns até usam havaianas e roupa de praia”, descreve. A postura é – revela – muito diferente, mais descontraída: “Tão descontraída ao ponto de os professores serem tratados pelos primeiros nomes. Por exemplo, tenho um professor que se chama Francis e é pelo nome que o abordamos.”

 

(Imagem Freepik)

 

A avaliação (a)típica

Em termos de avaliação, a Universidade Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro adopta métodos diferentes de avaliação. As notas só vão até 10. “É mais fácil ter um 10 no Brasil do que um 20 em Portugal. Os professores são mais benevolentes”, considera. No entanto, apesar de, segundo Catarina Barroso, “ser exigente porque, às vezes, chegamos a ter mais que um teste num dia e temos muitos trabalhos. Sinto que é um pouco mais leve do que em Portugal”.

Maria Marangas, na universidade belga Thomas More, refere que a parte teórica obriga a pensar muito mais, mas o ensino é muito prático: “Temos imensos trabalhos de grupo, a toda a hora, algumas cadeiras com dois trabalhos, outras com trabalhos e exames no final, sendo que só uma disciplina é que é 100% avaliada em exame”, explica. Como o ensino prático pode não ser completamente igual numa universidade e noutra, Maria reforça que não é, de todo, um prático igual ao de Portugal. “É um prático muito mais real: tem que se, por exemplo, organizar um evento que depois se vai mesmo realizar, o que é bom, mas tem um lado mau: damos as nossas ideias de graça”, especifica. A estudante defende que “o ensino superior português é mais difícil”. E apresenta outro ponto: “Aqui, ligam muito à inteligência artificial. Portanto, toda a gente usa o Chat GTP para cá e para lá, sem qualquer problema.”

Ana Marques, que em Portugal frequenta o mesmo curso que Maria Marangas, na Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa, confessa que sente que a sua instituição de ensino de origem “é muito mais puxada”: “Acontece tanto na matéria que estou a dar em Erasmus e já aprendi em Lisboa, no 1º ano do curso, como na preparação dos alunos para o mercado de trabalho. Na Sapienz, tudo é muito teórico.”

Madalena Carvalho conta que, na Universidade Ramon Llull, Facultat de Comunicació i Relacions Internacionals Blanquerna, de Barcelona, algumas unidades curriculares não têm exames, outras têm trabalhos finais e apresentações. A jovem considera que “o grau de exigência e dificuldade é menor quando comparada com a ESCS”.

Apesar da experiência diferente de Madalena Pancrácio, na Universidade Sabanci de Istambul, a jovem está convicta da qualidade do ensino em Portugal. “Achei muito mais fácil que na NOVA SBE, a minha universidade de origem. Há imensos trabalhos durante o semestre e pelo menos um trabalho de grupo, além de que duas das cadeiras nem sequer tinham exames. Os professores assumem que toda a gente vai às aulas, mesmo as teóricas, portanto a maioria deles não disponibilizam materiais de estudo”, conclui.

 

Por Teresa Freire, aluna da licenciatura em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa.

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