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Tropicália: a arte ao serviço da revolução

Uma onda de rebeldia e inovação tomou a arte brasileira durante a década de 60. Contra a censura, surge o movimento que representa a luta: colorido e psicadélico, tomando o mundo.

 

Os anos 60 são marcados por reviravoltas da população contra a norma. Num Brasil tomado pela ditadura militar, um grupo de artistas une-se e cria um movimento inspirado nesta onda de sentimento. Nasce o Tropicália ou Tropicalismo, com expressão em toda a forma de arte mas, sobretudo, na música. O objetivo era libertar a MPB (música popular brasileira) do intelectualismo da Bossa Nova e envolvê-la com a cultura popular, sempre para inovar. Cabelos compridos, túnicas, violência estética para chocar a criticar o conservadorismo brasileiro.

 

1928 – O ano em que nasceram os ideais onde se baseia o Tropicalismo/Tropicália. No ensaio “Manifesto Antropófago”, Oswaldo de Andrade enaltece a capacidade do Brasil de “canibalizar” (tornar seu após absorver) outras culturas. Segundo ele, enquanto a Europa se prendia ao primitivo, o Brasil inova-se. Assim, é a sua forma de se afirmar contra o domínio pós-colonial europeu.

 

1967 – A primeira vez que o termo Tropicália é usado, dando nome a uma obra de arte de Hélio Oiticica, no Museu da Arte Moderna do Rio de Janeiro. O desejo do artista era dar à arte um toque brasileiro. Com a sua criatividade, a obra representa a realidade do Brasil, em oposição à ordem do modernismo europeu.

 

21 de outubro de 1967 – Na noite da terceira edição do festival de Música Brasileira na Rede Record a Tropicália tomou forma. Primeiramente, por “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, que ficou na quarta posição na premiação final. “Domingo no Parque”, cantada por Gil e Os Mutantes foi outra música significativa. Os meios de comunicação batizaram de Tropicália os sons tocados por Caetano e Gilberto, carregados de reivindicação e inconformação, inspirados na obra de Hélio.

 

28 de outubro de 1968 – Gil e Caetano comandavam, semanalmente, o programa “Divino, Maravilhoso” na TV Tupi. Às 21h do dia 28 de outubro, foi ao ar o primeiro programa: farra, dança, rodopios, latas a fazer de bateria, risos e brincadeiras entre o par de músico. A emissora recebeu cartas de repúdio de vários pais, além de se terem gerado várias manifestações contra as cenas.

 

23 de dezembro de 1968 – A emissão de Natal do mesmo programa iniciou com Caetano a apontar uma arma à sua própria cabeça. Foi inspirado em cenas de Terra em Transe, de Glauber Rocha, mas também como homenagem a Assis Valente, compositor da marchinha “Boas Festas” que se matou dez anos antes, aos 47. Os tropicalistas criticavam, assim, a família tradicional brasileira e todas as suas normas.

 

20 de julho de 1969 – O show Barra ’96, a despedida dos maiores protagonistas de tropicalismo, Caetano e Gil, antes de serem exilados. Duas mil pessoas protagonizariam este momento histórico para a cultura brasileira, deixando, a seguir, o seu país.

 

 

O manifesto (musical) tropicalista

O ano de 1968 foi o mais importante para o tropicalismo brasileiro. Caetano lança o seu primeiro disco a solo e Gilberto Gil o seu terceiro, cheios de essência tropicália. O ponto alto deu-se, no entanto, com o disco colaborativo “Tropicália ou Panis et Circencis (Pão e Circo)”. Contou com Caetano, Gil, Os Mutantes, Tom Zé, Nara, Gal Costa, Torquato Neto e Capinam, e Rogério Duprat.

O álbum conjuga cultura brasileira com novas tendências como o rock ‘n’ roll, concretismo e a cultura pop, rendendo muitas críticas da ala conservadora da sociedade brasileira. Com 12 canções, traduzia o movimento: a releitura do brega (“Coração Materno” Vicente Celestino) e a incorporação do concretismo (em “Bat Macumba”) e dos elementos (“Baby” e “Parque Industrial”). A capa, claramente inspirada no álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Brand”, dos Beatles, reúne todos os músicos.

No disco pode ler-se “Tupi or not Tupi: that is the question”, uma alusão ao canibalismo de Oswaldo: por um lado, a menção dos índios Tupi que praticavam rituais de canibalismo e, por outro, o facto da própria frase ter sido “comida” a Shakespeare (“To be or not to be: that is the question.)

O movimento, efervescente, durou pouco mais de um ano, terminando com o exílio dos dois grandes protagonistas. No entanto, apesar da ditadura e da vida curta da Tropicália, a cultura brasileira nunca mais foi a mesma, nem na música, nem em qualquer outra forma de arte.

 

Em colaboração com a Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa

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